Parte substancial dos traumatismos ocorre dentro de casa. A pessoa
encosta o braço na frigideira quente ou no ferro de passar, joga carne na
panela, a gordura pula e atinge a mão de quem está cozinhando. Nesses casos, em
geral, as lesões são pequenas e saram sozinhas. No entanto, queimaduras
mais extensas e graves também acontecem e são comuns em crianças que se
aproximam do fogão, tocam nos cabos das panelas e viram o conteúdo – leite,
molho, água fervendo – sobre o próprio corpo.
Lesões com sangramento provocadas por objetos afiados e quedas também
ocorrem com certa frequência dentro de casa e, não raro, notícias sobre
mordeduras de cachorro e afogamentos ocupam espaço no noticiário da imprensa.
Prevenir esses acidentes deve ser preocupação de todos nós a todo
momento. Muitos deles seriam evitados com medidas simples e um pouco mais de
atenção
Abaixo colocamos em destaque alguns pontos da palestra:
Como pode ser definido o acidente doméstico?
Acidente implica a
ideia de fatalidade, de alguma coisa inevitável. No entanto, na imensa maioria
das vezes, tanto os acidentes ditos domésticos como os que ocorrem fora de casa
não têm nada de acidental. São provenientes de situações que poderiam ter sido
evitadas. Por isso, melhor seria usar o termo genérico — trauma –, ou
específico – queimadura, queda, afogamento – e esquecer a palavra acidente
nesses casos.
Quais seriam, então, os traumas domésticos mais frequentes?
Embora não possua
números definidos a respeito, com certeza, os traumas domésticos variam de
acordo com a faixa etária. As causas mais comuns e mais graves são sufocação
nos primeiros anos de vida e quedas nas pessoas mais velhas.
De modo geral, por alguma razão, a criança acaba morrendo sufocada por
cobertores, lençóis ou por estar em posição inadequada. Já nas faixas de idade
mais avançadas, as quedas são a causa mais comum de morte por traumas. Quedas
que ocorrem em escadas se a residência foi construída e/ou arrumada sem levar
em conta alguns aspectos básicos de prevenção e segurança. Entretanto, elas
podem ocorrer em qualquer faixa de idade. Por exemplo, traumatismos provocados
por quedas são comuns em crianças que sobem na laje da casa para empinar papagaio.
Outros traumas domésticos que costumam ocorrer com certa freqüência são
os afogamentos em piscinas, rios e represas, as queimaduras e as mordidas de
animais.
Quais são as medidas que devem ser tomadas de imediato quando ocorre um
trauma com sangramento?
Um dos ensinamentos
que a vida me proporcionou no atendimento de emergência é que a primeira
preocupação de todos nós deve ser não agravar a situação do paciente com
medidas inadequadas. Portanto, em cortes, queimaduras ou outros tipos de
traumas, na medida do possível, deve-se evitar o uso de produtos químicos ou de
soluções caseiras.
Não existe
sangramento, em lugar nenhum do corpo, que não estanque com a simples
compressão do local em que está ocorrendo a hemorragia. Tanto faz que o
sangramento seja no pé, na mão ou na cabeça. Se a pessoa pegar um paninho limpo
e exercer um certo grau de pressão sobre a ferida, pára de sangrar. O que não
pode é desesperar-se, fazer garroteamento ou colocar qualquer substância em
cima. Sangrou, põe um paninho limpo sobre o ferimento e aperta. Se for um corte
de menores proporções, em três ou quatro minutos, terá parado de sangrar e
acabou o problema. No entanto, se a lesão for maior e o sangramento mais
intenso, a vítima deve ser levada ao hospital para ser atendida por
profissionais da saúde, que cuidarão não apenas do ferimento, mas tomarão outras
providências, como saber se o paciente foi vacinado, se precisa de antibiótico
ou deve ser encaminhado para o serviço de cirurgia. Às vezes, mesmo um corte
pequeno pode necessitar de procedimento cirúrgico, mas esse é um julgamento que
cabe ao profissional de saúde dentro do hospital.
O que se deve fazer no caso de mordedura de cachorro?
Esse é um problema muito
crítico e que pode revestir-se de uma série de peculiaridades. Vamos imaginar
que a mordida de um cachorro tenha provocado uma lesão traumática muito grande
numa criança, porque arrancou um pedaço de pele, de músculo ou machucou a
articulação, por exemplo. Obviamente, nessas condições, o tratamento só pode
ser feito em regime hospitalar. Entretanto, como está implícito que a mordedura
de qualquer animal, inclusive de humanos, pode provocar infecções que se
alastram, porque na boca de todos eles existem várias bactérias, minha sugestão
é que se recorra ao serviço de emergência, mesmo que o ferimento seja pequeno.
Não é raro, dias depois do trauma, a criança ou o adulto aparecerem com
infecção das partes moles (pele, músculo) muito extensa. Além disso, ao morder,
animais também podem transmitir vírus, como o da raiva, e isso requer cuidados
especiais.
As pessoas devem procurar atendimento médico mesmo que as mordeduras
sejam pequenas e não haja sangramento?
Sangramento não é o
que causa preocupação maior nas mordeduras. O problema é a infecção que se
manifesta dias depois. Por isso, insisto em que a pessoa procure um médico para
orientar as medidas que devem ser tomadas quando for mordida por algum animal.
Um dos traumas mais freqüentes em casa são as queimaduras e as pessoas
se valem de medidas estranhas para aliviar a dor: esfregam manteiga, põem pó de
café, passam o cabelo no local queimado. O que é certo fazer nesses casos?
Não se deve pôr
absolutamente nada sobre a queimadura, nem mesmo uma substância química vendida
nas farmácias e promovida pelos laboratórios, na imprensa. Se a lesão for
superficial, a única coisa a fazer é proteger o local, a fim de evitar que uma
batida ou escoriação possa causar dor, só por causa disso.